Voto plural é autorizado com salvaguardas

Sanção presidencial mantém na Lei 14.195/2021  proteções e práticas defendidas pelo IBGC

  • 27/08/2021
  • Renan Perondi
  • Panorama Regulatório

O Governo Federal sancionou nesta quinta-feira (26) a Lei nº 14.195/2021, criada com o objetivo de melhorar o ambiente brasileiro de negócios e elevar a posição do país no ranking Doing Business, indicador utilizado pelo Banco Mundial. A nova legislação teve origem na Medida Provisória nº 1.040, de 2021, aprovada pelo Congresso Nacional em 5 de agosto.

Apesar de não fazer parte da proposta original do governo para a Medida Provisória 1.040, o voto plural – mecanismo que permite às companhias manterem uma ou mais classes de ações ordinárias com poder de voto multiplicado – passa agora a ser autorizado pela Lei 6.404/1976. Essa alteração na legislação societária se deu por causa de uma emenda à medida provisória apresentada pelo próprio relator da matéria na Câmara, o deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP).

O texto do voto plural utilizado por Bertaiolli reproduz quase que integralmente a proposta elaborada em 2020 pela Iniciativa de Mercado de Capitais (IMK), ação liderada pelas áreas áreas técnicas e autarquias do Ministério da Economia, com a participação de entidades do mercado de capitais e da sociedade civil, entre elas o IBGC.

Participação do IBGC

Desde as discussões no IMK, o IBGC deixou claro que o voto plural é um desvio ao princípio “uma ação, um voto”, defendido pelo Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa como aquele que mais promove alinhamento de interesses econômicos e políticos entre todos os acionistas da companhia. Por isso, se o voto plural fosse autorizado pela Lei 6.404/1976, deveria ser acompanhado de salvaguardas ou ações mitigadoras ao risco de desalinhamento de interesses.

Durante a tramitação da medida provisória, o IBGC dialogou com as assessorias técnicas de senadores, deputados e do próprio governo para defender a importância dessas salvaguardas, diante das pressões até os últimos dias para que fossem suprimidas do texto legal.

Salvaguardas ao voto plural

No fim, a Lei nº 14.195/2021 foi sancionada preservando as salvaguardas para a proteção da empresa e dos acionistas contra os riscos do voto plural. Dentre essas medidas, destacam-se os seguintes pontos:

• o voto plural pode ser adotado por companhias fechadas e companhias abertas - no caso de companhias abertas, desde que a criação da classe de ações com voto plural ocorra previamente à negociação de quaisquer ações ou valores mobiliários conversíveis em ações de sua emissão em mercados organizados de valores mobiliários;

• a criação de classes ordinárias com voto plural depende da concordância dos acionistas que representem:
         I – metade, no mínimo, do total de votos conferidos pelas ações com direito a voto; e
     II – metade, no mínimo, das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito, se emitidas, reunidas em assembleia especial convocada e instalada com as formalidades na lei.

•  limitação do voto plural ao poder máximo de dez votos por ação ordinária;

•  será assegurado aos acionistas dissidentes o direito de retirada da companhia mediante reembolso no valor de suas ações;

• após a oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) é vedada a alteração das características de classe de ações ordinárias com atribuição de voto plural;

•  os mercados organizados deverão dar transparência às companhias abertas que aderirem ao voto plural;

•  o voto plural terá prazo de duração máxima de 7 anos, podendo ser prorrogado por qualquer prazo, desde que:
        I – sejam observados quóruns mínimos para aprovação;
       II – sejam excluídos das votações de aprovação os titulares de ações da classe cujo voto plural se pretende prorrogar; e
      III – sejam assegurados os direitos aos acionistas dissidentes.

• as ações de classe com voto plural serão automaticamente convertidas em ações ordinárias sem voto plural se os titulares originais das ações as transferirem a terceiros;

• são vedadas as operações de incorporação, de incorporação de ações e fusão entre companhia aberta que não adote voto plural e companhia que adote o voto plural;

• é vedada a operação de cisão de companhia aberta que não adote o voto plural para constituição de nova companhia com adoção de voto plural;

• o voto plural não será aplicável em votações de assembleia de acionistas que deliberarem sobre remuneração de administradores e celebração de transações com partes relacionadas.

O único veto presidencial nesse tema retira a necessidade da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) elaborar e tornar público material de orientação aos agentes de mercado no qual enunciaria taxativamente os quóruns e as matérias a serem deliberadas pela assembleia geral que não seriam afetados pelo voto plural.

Nas razões para o veto, o governo justificou que a CVM já desempenha atividade consultiva e educativa e pode editar atos de orientação específicos, publicamente disponíveis, com respostas concretas a dúvidas reais e não criados somente por força de determinação legal.

Outras alterações na Lei nº 6404/1976

Entre 2019 e 2020, o IBGC fez parte de grupo técnico de apoio (GTA) constituído pela equipe econômica do governo que sugeriu normas de governança contidas na medida provisória (com exceção ao voto plural), sobretudo as práticas desenhadas para suprir as lacunas apontadas pelo Banco Mundial em aspectos relacionados à proteção de investidores minoritários.

As contribuições desse grupo técnico originaram boa parte do capítulo III da Lei 14.195/2021, especificamente o artigo 5º. Durante a tramitação da matéria na Câmara e no Senado, o IBGC também atuou para defender a permanência no texto de práticas de governança consagradas por referências internacionais e nacionais, como o código do IBGC.

Dentre as novidades trazidas pelo art. 5º da Lei nº 14.195/2021, merecem destaque as seguintes disposições:

• veto ao acúmulo de cargo de presidente do conselho de administração e diretor-presidente, mas fica previsto que a CVM poderá editar ato normativo que excepcione o veto para companhias de menor porte;

• presença obrigatória de conselheiros independentes nos conselhos de administração de companhias abertas, com termos e prazos a serem definidos pela CVM;

• a competência da assembleia geral deliberar sobre a celebração de transações com partes relacionadas, a alienação ou a contribuição para outra empresa de ativos, caso o valor da operação corresponda a mais de 50% do valor dos ativos totais da companhia no último balanço aprovado;

• ampliação de 15 para 21 dias do prazo de antecedência da primeira convocação de assembleias de acionistas de companhias abertas;

• possibilidade de que a CVM determine o adiamento de assembleia geral por até 30 dias  em caso de insuficiência de informações necessárias para a deliberação, contado o prazo da data em que as informações completas forem colocadas à disposição dos acionistas.


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