As sociedades por ações devem, anualmente, até o mês de abril, realizar a assembleia geral ordinária de seus acionistas (AGO). Dentre os principais objetivos de uma AGO, destacam-se a prestação de contas da administração, com o exame e discussão das demonstrações financeiras do ano anterior, a destinação dos resultados sociais apurados e, ainda, quando for o caso, a eleição dos administradores da companhia (Diretoria Executiva e Conselho de Administração).
Atualmente, a volatilidade e a complexidade no ambiente de negócios estão mais intensas, produzindo cenários extremos e diversos. Uma tempestade de desafios! Incertezas econômicas, geopolíticas e climáticas; tecnologias disruptivas; ameaças à segurança cibernética; ética e cultura corporativa; apenas para citar alguns. Não se pode mais negligenciar a importância crescente de boas práticas de governança corporativa neste ambiente.
De um lado, os investidores confiam aos conselhos de administração a responsabilidade de navegar em meio a essa tempestade, demandando eficiência operacional, retorno financeiro e valorização do preço das ações. Do outro, as empresas precisam oferecer respostas positivas aos anseios dos demais stakeholders, cujos interesses podem ser afetados pelas realizações dos objetivos de uma organização. Mais do que nunca o desempenho de uma corporação é julgado por meio de um amplo espectro de métricas e parâmetros e não apenas pelo preço das ações.
Essa abordagem estabelece uma nova narrativa empresarial: para prosperar, não basta o desempenho financeiro. Os modelos de gestão devem ser capazes de incorporar as dimensões social e ambiental à estratégia de negócios da empresa, buscando promover a elevação da qualidade de vida, a inclusão social e o combate efetivo à pobreza e à degradação ambiental.
Os conselhos de administração precisam se responsabilizar pelo desempenho das organizações
Não por outro motivo, empresas vêm buscando maneiras de demonstrar seu compromisso com os países, regiões e comunidades onde fazem negócios, alterando suas decisões de investimento a partir de metas não necessariamente pautadas unicamente pela lógica financeira.
Elo entre os sócios e a diretoria executiva, o conselho orienta e supervisiona a relação da gestão com as demais partes interessadas, de modo que cada parte receba um benefício apropriado e proporcional ao vínculo que possui com a empresa. Tendo como origem a teoria da agência, emergiu a mais importante das recomendações sobre a arquitetura dos conselhos: ter uma maioria de conselheiros externos e, idealmente, independentes. Como resultado, a presença de conselheiros independentes tem sido, cada vez mais, uma alternativa para as companhias.
Conselheiros independentes contribuem significativamente no processo decisório, reforçam a objetividade e protegem os interesses da organização, mitigando eventuais conflitos de interesse ou influência indevida. A independência correlaciona-se com a equidade e a honestidade intelectual. Equidade é consequência do equilíbrio que deve prevalecer na tomada de decisão. Uma pessoa que age de forma independente, examina cuidadosamente os fatores que afetam uma determinada questão; pesa os prós e contras; delibera mostrando prudência, sem recorrer ao açodamento que pode levar ou facilitar o erro; e mostra empatia e delicadeza no trato de seus interlocutores.
Além disso, a independência vincula-se à honestidade intelectual, ou seja, o reconhecimento que nossa racionalidade é limitada e nosso conhecimento pode não ser o ideal. Outrossim, é inegável que devemos nos esforçar ao máximo para dispor de informações corretas, rigorosas e contrastadas. O conselho de administração é um dos ativos estratégicos mais críticos de uma empresa e deve aproveitar as opiniões divergentes na hora de resolver problemas e inovar. Uma governança eficaz requer criatividade e dinamismo. Lato sensu, pode-se afirmar que o objetivo central da independência é potencializar a efetividade do conselho em suas prerrogativas.
Entretanto, a relação entre a independência e a efetividade dos conselhos é bem mais complexa do que parece, uma vez que as métricas e critérios para avaliar essa efetividade são discutíveis. Evidências empíricas sugerem que os conselheiros independentes têm legitimidade para cumprir o papel de mediação no alinhamento dos diferentes stakeholders e sua ascendência sobre a gestão. O objetivo é garantir que estas relações sejam gerenciadas como parte da gestão integrada de riscos - dever indelegável do conselho -, fortalecendo a execução da estratégia. Na maioria das empresas, porém, esta interlocução com os stakeholders limita-se, na melhor hipótese, à gestão da reputação e, na pior, à gestão de crises. Apenas uma governança de ‘checklist’ sem, necessariamente, discutir em profundidade seus impactos e/ou contribuições para a consecução das metas estratégicas.
Contrariamente, não se pode conceber que a única contribuição de um conselheiro de administração seja a sua independência. Um conselheiro de administração é atuante e diligente quando faz perguntas, inclusive as mais difíceis, conhece as boas práticas de governança, gestão, administração estratégica, questões tributárias, financeiras e comerciais, tendo sempre como foco a geração de valor e a sustentabilidade de longo prazo da organização.
Sobre o autor: Andriei Beber é Conselheiro de Administração, Professor dos Programas de Formação Executiva da FGV e Coordenador do Capítulo Santa Catarina do IBGC