“Não adianta a empresa ter um código de ética bonito e as mentes mais brilhantes em seus comitês, se ela não acreditar, de verdade, que a governança é importante”. A frase é de Rogério Mota, diretor técnico do Instituto de Auditoria Independente do Brasil (Ibracon Nacional) na ocasião do evento “Escândalos corporativos: o que a governança precisa fazer”, promovido pelo IBGC na última quarta-feira, 15 de março, em sua sede, em São Paulo. A mensagem do executivo veio após um debate circunspecto sobre a importância da governança permear todas as instâncias das organizações, guiada por uma cultura ética na prática.
Nas modalidades presencial e on-line, o encontro – que reuniu associados do instituto e demais interessados – teve o objetivo de debater a contribuição da governança na prevenção e enfrentamento de escândalos corporativos, com olhar para alguns casos mais recentes, como o da Americanas, que afetou o mercado depois de uma dívida de pelo menos R$ 20 bilhões vir à tona, em 11 de janeiro de 2023.
Com moderação de Roberto Faldini, cofundador do IBGC e conselheiro de diferentes organizações, o debate seguiu na linha de discutir os possíveis agentes e as práticas de detecção de fraudes, os deveres das companhias abertas em comunicações ao mercado, além de operações frequentes que induzem às inconsistências contábeis. Sem esquecer a relação da governança corporativa com tudo isso.
De acordo com Sandra Peres, analista sell side do PagBank e conselheira da Apimec Brasil, no caso Americanas dificilmente um investidor pessoa física identificaria uma dívida como a que se viu, mas também os analistas financeiros teriam essa dificuldade, pois ao negociar com bancos a empresa continuou tratando como dívida de fornecedores, uma despesa que, na verdade, passava a ser financeira - sujeita a juros dos bancos com quem negociava. A prática, chamada de risco sacado é comum em empresas de varejo.
“O risco sacado não é um problema. Mas é preciso esclarecer como é divulgado e computado. Apesar do valor não surgir do nada e estar ali, ele foi incluido em um lugar que não era o certo. Não é que o montante não estava sendo contabilizado. O que não se sabe é se essa dívida é fruto de alguma inconsistência nas contas ou se foi uma fraude”, explicou Sandra.
A situação trouxe à tona debate sobre o papel da auditoria e as práticas internas de compliance nas empresas. “O que faz um auditor? Ele é um agente que parte da demonstração financeira elaborada pela empresa. Ele não participa da gestão da companhia, da execução e do monitoramento do controle interno. É um ambiente de controle interno e governança saudáveis que facilita o trabalho de auditor”, ponderou Rogério. Na visão de Marcelo Zenkner, sócio nas áreas de direito administrativo e projetos governamentais e de compliance na TozziniFreire Advogados, é a governança quem tem que prevenir situações assim.
“A governança permite o caráter preventivo. O
compliance tem, entre os seus elementos, o controle interno, mas que não se confunde com a auditoria, que é posterior. Para que o
compliance funcione bem é preciso garantir independência e autonomia ao
compliance officer na organização", descreveu Marcelo, mencionando também que a Comissão de Valores Mobiliários, a CVM, por meio da sua instrução CVM 158, orienta às companhias que passem com mais clareza as informações das operações de risco sacado.
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