“Governança em estatais sempre foi prioridade para o IBGC”

Valeria Café fala da importância da Lei 13.303 e alerta para o risco de retrocessos com possível flexibilização do artigo 17 da lei

  • 13/04/2023
  • Da redação
  • Bate-papo

O IBGC tem se posicionado contra propostas de alterações em Projetos de Lei/Medidas Provisórias que vêm surgindo com vistas a alterar a Lei das Estatais  (nº 13.303/16), especialmente o que diz respeito aos critérios mínimos para a ocupação de cargos gerenciais nessas companhias, o artigo 17. Algo que pode tornar a lei vulnerável e que permitiria a volta de participação de políticos a cargos eletivos.

Em uma rápida retrospectiva para situar a entrevista que se segue com Valeria Café, diretora de Vocalização e Influência do instituto, algumas das propostas recentes são:

Dezembro de 2022: foi aprovado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2896 que reduz de 36 meses para 30 dias o prazo em que um político deve se desvincular da atividade para tomar posse em cargo de diretoria ou de conselho de administração em uma estatal. Um movimento muito grande da sociedade civil, liderado pelo IBGC, que apoia a manutenção da Lei das Estatais e do Artigo 17, fez com que o projeto parasse no Senado Federal. Confira nota de repúdio do instituto aqui.

Março 2023: o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu os efeitos de norma da Lei das Estatais que restringe indicações de conselheiros e diretores que sejam titulares de alguns cargos públicos ou que tenham atuado, nos três anos anteriores, na estrutura decisória de partido político ou na organização e na realização de campanha eleitoral. Ao lado de outras entidades de mercado, o IBGC subscreveu o posicionamento. Veja aqui.

Abril de 2023: Medida Provisória (MP) 1154, foi apresentada com uma emenda que aborda o Artigo 17 e reduz de três para um ano a quarentena, possibilitando que ministros e políticos sejam indicados a cargos em estatais.

No bate-papo com o Blog IBGC, Valeria Café nos mostra como tem sido o posicionamento do instituto, contrário a alterações na Lei das Estatais, inclusive, com dados que apontam os resultados positivos alcançados pelas estatais após a aplicação da lei.

BLOG IBGC: Por que tratar de Governança em Empresas Estatais é importante?
Valeria Café: O IBGC acredita que as empresas estatais têm um papel relevante na economia brasileira. Elas atuam na prestação de serviços públicos de grande importância para o bem-estar da população e em setores que demandam investimentos relevantes. O IBGC acredita que aprimorar a governança dessas empresas é contribuir para uma sociedade melhor. Governança de estatais sempre foi prioridade para o IBGC: participamos do debate da Lei das Estatais, em 2015 e 2016; fizemos acordo de cooperação com a Secretaria de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (SEST) e temos ajudado o seu corpo técnico a desenvolver materiais específicos para encaminharem as estatais federais. Fizemos uma série de pesquisas, publicações, posicionamentos e eventos. Mantemos o curso Aprimoramento em Governança para Administradores e Conselheiros Fiscais de Estatais que, em cinco anos, já formou mais de mil alunos.

Como o instituto avalia a Lei 13.303 e qual a importância do Artigo 17 para as empresas estatais?
A Lei n° 13.303/2016, também conhecida como Lei das Estatais, foi sancionada em meio a preocupação em garantir que as empresas estatais sejam governadas de maneira isonômica e transparente para o alcance de seus objetivos, combatendo as situações que possam gerar riscos de captura e de práticas ilícitas. Ela determina dentre outros aspectos, a obrigatoriedade da adoção de boas práticas de governança corporativa nas empresas estatais no âmbito da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. O Artigo 17 ajuda a reduzir a possibilidade de um profissional assumir cargo, com conflito de interesses na hora de tomar decisões para a estatal que representa. Acreditamos que em uma estatal, assim como em qualquer outra empresa, a decisão do estatutário tem que ser para o bem e longevidade da empresa.

Como é a atuação de advocacy do instituto?
Temos no instituto uma área de Relações Institucionais e Governamentais que é responsável por interlocuções com diferentes stakeholders no Brasil e no mundo. No começo do ano fomos conhecer quem estava chegando no governo. Fizemos um roteiro em Brasília para levar a nossa Agenda de Governança Corporativa, lançada em setembro de 2022, e falar sobre a importância da manutenção da Lei das Estatais. Contatamos gabinetes de senadores, deputados e diferentes ministérios, como o da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Secretaria de Coordenação das Estatais (Sest), Ministério da Fazenda, Secretaria de Reformas Econômicas, Controladoria-Geral da União, a Casa Civil e a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República.

Qual é o papel do IBGC diante das investidas contra a Lei que foram listadas durante a retrospectiva?
Nosso papel enquanto organização da sociedade civil é nos posicionarmos, mantermos um diálogo, e mobilizarmos a sociedade. Temos solicitado várias reuniões com o Governo Federal. Conversamos, no dia 12 de abril, com a Secretaria Geral da Mesa do Senado. E pedimos reunião com a vice-presidência da República e o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos. Para defender o que é possível e dentro do possível, estamos fazendo tudo nos limites que a lei nos proporciona. Temos uma  equipe de gestão dedicada a trabalhar essas questões relacionadas à Lei das Estatais e uma equipe de voluntários dedicada a nos ajudar nesse movimento: Transparência Internacional - Brasil, Câmara de Comércio Internacional - ICC Brasil, Instituto Ethos, Associação dos Investidores no Mercado de Capitais (AMEC), Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE), APIMEC Brasil - Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais, Instituto Não Aceito Corrupção (INAC), Movimento Brasil Competitivo, Transparência Brasil, e Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças - IBEF-SP e RS). Estamos aqui para colaborar com a governança das estatais.

E como tem sido a mobilização do instituto na sociedade civil?
Por conta disso, temos falado constantemente com a imprensa e com o governo; divulgamos matérias, podcasts e promovemos eventos sobre a importância da lei. Criamos a Agenda de Governança Corporativa, como mencionei, com temas importantes e o seu item dois enfatiza a necessidade de se preservar e respeitar os avanços para a governança corporativa advindos da Lei das Estatais, além da instituição de uma política de propriedade estatal. A publicação do IBGC sobre o tema aponta a importância do Governo Federal ter uma política de propriedade e mostra que existem exemplos de outros países que também as implementaram. São políticas que ajudam os governos a definirem objetivos, metas e métricas para as estatais, inclusive, identificando o quanto elas evoluem no atendimento das políticas públicas a que se propõem e para a sociedade, em geral.

Na Agenda de Governança Corporativa que você menciona, a Governança em Estatais está entre os macrotemas. Como você espera que este material impacte os legisladores?
O que acontece no Congresso e está relacionado à governança corporativa, passa pelo IBGC. Acompanhamos tudo que se refere ao mercado de capitais, à governança climática, à governança de estatais, à inovação e à transformação digital. Todos esses temas estão nas sete medidas da agenda e acreditamos que são significativos para a sociedade, para a economia e são promotoras da qualidade de vida da nossa população. Portanto, são de interesse do poder público. Estamos muito atentos não só a governança de estatais, mas também aos temas relacionados ao meio ambiente (ESG), mercado de capitais, preenchimento do Pratique ou Explique das empresas listadas, alterações na Lei das SA, regulamentações da CVM e autorregulação da B3, entre outros.

Quais são as evidências que comprovam a efetividade do investimento e de boas práticas de governança em estatais?
Existe relação comprovada no mercado que, quanto melhor a governança de qualquer empresa, estatal ou listada, melhor os seus resultados. Se olharmos o ativo total das empresas estatais, subiu, e se olharmos o patrimônio líquido, também evoluiu. Com a SEST criamos e participamos, com outras entidades do setor, da avaliação do indicador de governança chamado IG-Sest, desde 2017, e apoiamos a elaboração do estatuto social modelo, que as empresas estatais federais têm como base para elaborarem seus estatutos.

O IG-Sest mostra a evolução da governança nas empresas - a nota média das empresas em 2017 foi 4,15 e 9,68, em 2022. Isso significa que a lei ajudou as empresas a, afetivamente, terem mais governança, o que se comprova com dados do próprio governo. Além disso, vem subindo o percentual de empresas que publicam a carta anual de políticas públicas e governança, existente na Lei das Estatais. A média hoje está por volta de 41% delas.

Veja aqui a lista de notas e posicionamentos do IBGC.

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