“O setor privado tem que evoluir do compromisso para a ação”

Ana Aranha, do Movimento Transparência 100%, afirma que faz bem para o mercado empresas integradas e comprometidas com a pauta anticorrupção

  • 28/03/2023
  • Angelina Martins
  • Bate-papo

Primeira iniciativa de fomento à transparência corporativa do Brasil, o Movimento Transparência 100% quer encorajar e capacitar as empresas para irem além das suas obrigações legais, fortalecendo mecanismos de transparência e integridade, tornando-as mais resilientes e exemplos de sucesso para outras empresas.

O Movimento Transparência 100% é uma das oito ações do Ambição 2030, do Pacto Global da ONU no Brasil, consideradas chamamentos às empresas brasileiras sobre a urgência e a necessidade de se promover ações concretas, com metas e compromissos públicos. E, por considerá-lo uma ação que fortalece ainda mais os princípios básicos de governança corporativa propostos em sua Agenda Positiva de Governança, o IBGC firmou apoio ao movimento, em 2022.

A seguir, acompanhe o bate-papo com Ana Aranha, gerente anticorrupção e ponto focal do Movimento Transparência 100%, que aborda temas como a Ambição 2030, do Pacto Global da ONU, compromissos das lideranças empresariais públicas e privadas e aceleração das ações relacionadas à transparência. 

Blog IBGC: Em que frentes vocês estão trabalhando para engajar a alta liderança das empresas brasileiras e conseguir o compromisso efetivo em relação à transparência 100%?
Os compromissos dos movimentos do Ambição 2030 devem ser assinados pela alta liderança das empresas. Ou seja, o engajamento vem desde o momento da assinatura. Além disso, pelo menos em dois momentos durante o ano, os CEOs das empresas são convidados a participarem de ativações, por meio de cafés da manhã e CEO Roundtable. Estes são momentos de estabelecer diálogo com as lideranças comprometidas com os movimentos, apresentando indicadores de como as empresas estão hoje em relação às metas e discutir quais os maiores desafios encontrados no caminho até aqui. Em termos do Movimento Transparência 100%, o Pacto Global da ONU no Brasil entende que para alcançar uma economia verdadeiramente transparente que beneficie a todos, o setor privado tem que evoluir do compromisso para ação – da política de tolerância zero contra a corrupção, para conduzir avaliações de risco de seus fornecedores, se relacionar de forma íntegra com setor público, proteger denunciantes de irregularidades e fortalecer anticorrupção na cadeia de valor – temas das metas do movimento.

O Pacto Global definiu alguns “movimentos”, além do Transparência 100%, relacionados a outros temas também urgentes como “Elas Lideram 2030”, “Movimento Raça é Prioridade” e “Movimento Ambição Net Zero”. Esse tipo de setorização causa mais impacto no retorno das empresas em relação à causa?
No Brasil, a partir do lançamento da Ambição 2030, mais de 500 empresas entraram no Pacto Global - uma busca intensa do setor privado para acelerar o impacto positivo. Os movimentos apresentados foram estruturados para tratar das questões mais urgentes, ligadas aos ODS prioritários para o Brasil. Em um ano, os movimentos já realizaram mais de 70 workshops, lives e treinamentos; mais de 120 horas de formação, das quais participaram quase dois mil profissionais. Estamos acelerando, porque o tempo em que vivemos pede urgência.

Como garantir que as empresas, públicas e privadas assumam e cumpram os  compromissos sugeridos pelo movimento? Que tipo de critério é adotado para evitar que empresas usem esta iniciativa como greenwashing?
Os movimentos – assim como o próprio Pacto Global – são um chamado, um compromisso voluntário assumido pelas empresas. Não são iniciativas que visam certificar ou auditar o trabalho. O ponto principal é construir com as empresas o caminho (ambicioso) para alcançar as metas propostas. O trabalho e o esforço são coletivos e colaborativos. Todos os movimentos possuem Jornadas do Conhecimento e momentos de troca de boas práticas e experiências. Além disso, as empresas reportam voluntariamente e anualmente como estão em relação às metas assumidas. Temos ainda o Observatório 2030, iniciativa do Pacto Global da ONU no Brasil, apoiada por organizações parceiras, que monitoram dados públicos das empresas brasileiras em cinco categorias (clima, gênero, corrupção, salário digno e água).

No IBGC, disseminamos a importância da coerência entre iniciativas e princípios da governança corporativa, como a transparência. Como vocês avaliam o grau de maturidade de empresas públicas e privadas em relação a temas que necessitam fundamentalmente de transparência e integridade, como saneamento básico, educação, saúde, mudanças climáticas e agricultura?
Por meio do do Movimento Transparência 100% observamos que o tema, apesar de vir ganhando espaço, ainda é um tabu em várias organizações – e o movimento também contribui para essa virada de página. As empresas começam a entender que pode ser benéfico se abrir em termos de integridade e compliance: faz bem para o mercado e para o mundo dos negócios saber que as empresas estão integradas e comprometidas com a pauta anticorrupção. Esse movimento de busca por mais transparência é global. O movimento vai na linha do que de mais atual e ambicioso tem sido discutido na arena internacional anticorrupção. De acordo com o Guia da OCDE para Empresas Multinacionais, “as empresas devem aumentar a transparência de suas atividades na luta contra a corrupção, suborno e extorsão. Medidas podem incluir realizar compromissos públicos contra a corrupção, divulgar sistemas de gestão e controle interno, programas de compliance e ética. Empresas também devem encorajar abertura e diálogo com o público para promover a conscientização e a cooperação na luta contra a corrupção” - (OECD Guidelines for Multinational Enterprises).

Como fortalecer a transparência na gestão pública, se há movimentos considerados por organizações como retrocessos? Por exemplo, a aprovação pela Câmara dos Deputados do Projeto de Lei 2.896/2022, que altera os artigos 17 e 93 da Lei das Estatais.
Na 1ª reunião da Plataforma de Ação contra corrupção do Pacto Global, este ano,  discutiu-se justamente o tema das boas práticas de governança e integridade nas empresas estatais, com apresentações do IBGC, OCDE e CGU. Os guias que a OCDE produz sobre recomendações de governança nas estatais e na América Latina são bons pontos de partida para que o país possa avançar nesse tema. Por exemplo, que a União tenha claramente definido o objetivo de se ter uma empresa estatal, com metas claras e públicas, para que se evite apropriações indevidas das estatais para fins não republicanos. A OCDE recomenda boas práticas de governança na escolha dos conselhos de administração das estatais, de preferência incluindo critérios de integridade.


Acesse também informações sobre o Fórum de Debates: Combate à Corrupção como Pilar do ESG, realizado pelo IBGC

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